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Bem vindo!Esta página está sendo criada para retransmitir as muitas informações que ao longo de anos de pesquisas coletei nesta Mesorregião Campo da Vertentes, do centro-sul mineiro, sobretudo na Microrregião de São João del-Rei, minha terra natal, um polo cultural. A cultura popular será o guia deste blog, que não tem finalidades político-partidárias nem lucrativas. Eventualmente temas da história, ecologia e ferrovias serão abordados. Espero que seu conteúdo possa ser útil como documentário das tradições a quantos queiram beber desta fonte e sirva de homenagem e reconhecimento aos nossos mestres do saber, que com grande esforço conservam seus grupos folclóricos, parte significativa de nosso patrimônio imaterial. No rodapé da página inseri link's muito importantes cuja leitura recomendo como essencial: a SALVAGUARDA DO FOLCLORE (da Unesco) e a CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO (da Comissão Nacional de Folclore). Este dois documentos são relevantes orientadores da folclorística. O material de textos, fotos e áudio-visuais que compõe este blog pertencem ao meu acervo, salvo indicação contrária. Ao utilizá-lo para pesquisas, favor respeitar as fontes autorais.


ULISSES PASSARELLI




quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Matosinhos: impressões diversas do século XIX

Este tópico reúne notícias avulsas e desconexas alusivas a Matosinhos durante os oitocentos. 

O século XIX foi o tempo áureo do grande bairro. Seu território se encheu de chácaras vetustas e suas grandiosas festas tornaram-se célebres. Os viajantes estrangeiros testemunharam o viço dessa época. Os jornais noticiaram aspectos os mais diversos. Vejamos algumas notícias. 

1- Notícias militares

CINTRA (1982) registrou o surgimento de uma unidade militar no bairro:

A 23-3-1802 Bernardo José de Lorena, Governador da Capitania de Minas, concedeu a Manoel Gomes de Almeida Coelho (faleceu a 28-9-1838) a patente de capitão da Cia. de Ordenança do Novo Distrito da Cappela do Senhor de Matozinhos, da Vila de São João del-Rei. Ingressou na Irmandade do SS. Sacramento a 12-6-1804. A mesma autoridade a 10-5-1802 nomeou para o posto de alferes do citado distrito Clementino José Ribeiro Carmo[1]. (grifei)

Durante a Guerra do Paraguai (1864-1870), a capela foi ponto de recepção de combatentes. A soldadesca ali pousava, se alimentava, assistia missa e seguia viagem.

2- Coronel Pamplona

Matosinhos tornou-se um lugar procurado para o lazer, o descanso e o tratamento de doenças que exigiam o repouso e o ar puro. Isso porque o local era considerado aprazível,  bucólico. O Coronel Inácio Correia Pamplona (latifundiário, destruidor dos quilombos do oeste do estado e terceiro delator da Inconfidência Mineira), no fim de sua vida, mudou-se da Fazenda do Mendanha (em Lagoa Dourada) para Matosinhos, onde adquiriu uma chácara, em busca desse tão decantado sossego, já que estava com a saúde abalada [2]. Foi eleito imperador do Divino no ano de 1810. Nesse mesmo ano faleceu. Seu testamento está no arquivo regional do IPHAN, situado em São João del-Rei e contém um recibo de doação para o festejo do Espírito Santo, cujo teor é o seguinte:

Recibo dado ao Padre Inácio Correia Pamplona, referente à ajuda que seu pai deu à Festa do Divino do ano de 1810. Recebi do Sr. Reverendo Pe. Inácio Correia Pamplona, a quantia de cem mil réis que me deu por ordem do Sr. seu pai o Senhor Coronel Inácio Correia Pamplona, cuja quantia é a mesma, que o dito Sr. prometeu dar para a festa que fizemos do Espírito Santo em Matttosinhos em ano de 1810, quando o Sr. Coronel foi Imperador e eu Juiz. Por ser verdade faço o presente. São João, 13 de junho de 1810 – José Francisco Lopes.


O referido sacerdote, também foi testamenteiro de seu pai, de quem herdou grande fortuna, já que quatro de suas irmãs foram reclusas no Convento de Macaúbas e uma quinta casou.

Do seu testamento consta ainda outra doação de cem mil réis, desta feita destinada a se celebrar“25 missas a Nossa Senhora da Lapa, presente no altar do Senhor Bom Jesus de Mathosinhos”.

Registrou CINTRA (1982), que em 1811 o padre supracitado dispôs da chácara que herdara do pai:    

A 1-5-1811 o padre Pamplona Corte Real [filho do Cel. Inácio Correia Pamplona] vendeu u’a chácara grande, toda murada e valada, com terras de cultura, arvoredos e mais plantas, situada no Arraial de Matozinhos da Água Limpa, “subúrbio de São João del-Rei”, à Maria Angélica de Sá Menezes, viúva do Cel. Carlos José da Silva, pais do Barão de Pouso Alto.

3- Um documento eclesiástico

A ligação entre o Estado e a Igreja que havia nesses tempos obrigava que, além das autorizações eclesiásticas, houvesse também as do poder público para as práticas religiosas. Não foi diferente aqui. Demorou, em virtude da burocracia, ainda onipresente. O Príncipe Regente Dom João VI, expediu em 27 de maio de 1811, um documento concedendo autorização aos devotos para que usassem a Capela do Bom Jesus de Matosinhos, dentro das regras do costume. Observe-se que a ordem eclesiástica já fora concedida em 1774 pelo Arcebispo Dom Bartolomeu [3].

4- Anúncio de venda de uma chácara

"Vende-se uma boa chacara situada no Arraial de Mattosinhos, quem a pretender dirija-se ao seu proprietario abaixo assignado. São João d’El-Rey 29 de Outubro de 1878. Luiz Dalle." [4]

5- Inspiração literária

Em 1881 um jornal são-joanense publica no folhetim o conto novelesco intitulado “Morgadinha de Mattosinhos” [5].

6- O “lixão” já foi na área da Vila Nossa Senhora de Fátima (Grande Matosinhos)

O Código de Posturas aprovado em 1887 pela Câmara Municipal previa no seu capítulo XXVII, artigo 238 uma área do bairro para despejos “de lixo e outra qualquer immundicie e enterramento de animais mortos e generos alimenticios corrompidos, nesta cidade, o campo que fica em triangulo na embocadura do Agua-Limpa no rio das Mortes” (etc.) [6].

7- Casório

Fora das festas, pouco movimento havia no templo deste arrabalde. Casamentos eventualmente ali celebrados viravam notícias sociais [7]:

(...) "realizou-se, na igreja de Mattosinhos, o casamento da Exma. Sra. D. Antonia Carolina Braga, filha do nosso distincto e nunca esquecido amigo Dr. Salathiel de Andrade Braga, com o sr. Francisco Pereira da Malta Laudares."

8- Festa em Matosinhos tira público do teatro      


As festas eram mesmo o ponto alto do bairro. Foi anunciado pela imprensa, que o fracasso da estréia teatral da “Companhia de Zarzuellas e Japoneza”, em razão da falta de público no teatro, se deveu ao fato de que todos tinham descido para a afamada festa [8]: “Como era de prever, foi a estréa desta companhia pouco concorrida após as concorridas festas em Mattosinhos, onde esteve esta cidade durante quatro dias e quatro noites”.

9- Sutil


Em 1896 há um anúncio de venda da “Fazenda do Suptil”, pela Companhia Agrícola e Industrial Oeste de Minas. Media 143 alqueires (cerca de 710,4 hectares)[9]. Do negócio se excluíam os 10 alqueires nos quais se situavam uma caieira e a Casa da Pedra. Tal propriedade corresponde à atual povoação do Sutil, no distrito da sede, arrabalde de Matosinhos beirando a via férrea, jurisdição eclesiástica da paróquia de Matosinhos, comunidade do Bom Pastor [10].

10- Torre danificada

No ano de 1897 foi idealizada uma loteria para arrecadar fundos para reforma de uma das torres da igreja de Matosinhos. Seria para o dia 07 de janeiro mas por não terem sido vendidos todos os bilhetes, a extração foi adiada para 4 de abril. Ocorreu o sorteio da loteria no definitório da igreja do Carmo, sob os cuidados do tesoureiro Miguel Archanjo da Silva [11].

A 21 de maio de 1899, às 14 horas, no domingo de Pentecostes, reunia-se uma comissão no consistório da igreja de Matosinhos, sob a orientação do vigário padre João da Trindade, com destino a prestar contas dos reparos na torre direita daquele templo, “que ruiu há tempos, por occasião de lamentavel desastre”. A lisura dos números apresentados foi muito elogiada. Os cabeças da dita comissão foram: José Justino Silva, Francisco Leopoldo das Chagas e Paulo Evangelista de Magalhães [12].

Notas e Créditos 

* Texto: Ulisses Passarelli



[1]- No século XVIII as companhias de ordenança habitualmente se estabeleciam nos locais de mineração. Era uma forma de se vigiar a atividade tão valiosa para a metrópole.
[2]- Segundo HENRIQUES (2003) seria a Chácara Palestina, “comprada do Capitão João Batista Machado por 700$000 em 1808, e outra unida a esta, que arrematou dos órfãos de D. Joaquina Leocádia, onde o Coronel Pamplona investiu em muitas obras, usando seus escravos.”
[3]- Fotografia deste documento veio a público durante a exposição sobre a história da devoção ao Bom Jesus de Matosinhos, durante o seu jubileu em 2003, no Centro Social e Cultural da Paróquia. Foi organizada pelo artista sacro Osni Paiva, grande estudioso e defensor da cultura e história da cidade e especialmente deste bairro.
[4]- Arauto de Minas, n. 33, 24/11/1878.
[5]- Tribuna do Povo, n. 15, 17/07/1881 a n. 18, 07/08/1881.
[6]- VENÂNCIO, Renato Pinto, ARAÚJO, Maria Marta (org.). São João del-Rey: uma cidade no Império. Belo Horizonte: SEC / Arquivo Público Mineiro, 2007. p. 180.
[7]- Gazeta Mineira, n.59, 27/10/1884.
[8]- O Resistente, n.55, 30/05/1896.
[9]- Alqueire, segundo AULETE (1978) é uma medida agrária usada no Brasil, de valores variáveis conforme a região: 48.400 m2 (na prática 48.000) em Minas, Goiás e Rio, sendo conhecido por “alqueire mineiro”; em São Paulo, 24.200 m2 (na prática 24.000), o conhecido “alqueire paulista”, e no norte a medida é 27.225 m2.
[10]- O Resistente, n.54, 21/05/1896.
[11]- O Resistente, n.72, 07/01/1897; n.83, 11/03/1897 e n.85, 08/04/1897.
[12]- S. João d’El-Rey, n.19, 27/05/1899. 

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