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Bem vindo!Esta página está sendo criada para retransmitir as muitas informações que ao longo de anos de pesquisas coletei nesta Mesorregião Campo da Vertentes, do centro-sul mineiro, sobretudo na Microrregião de São João del-Rei, minha terra natal, um polo cultural. A cultura popular será o guia deste blog, que não tem finalidades político-partidárias nem lucrativas. Eventualmente temas da história, ecologia e ferrovias serão abordados. Espero que seu conteúdo possa ser útil como documentário das tradições a quantos queiram beber desta fonte e sirva de homenagem e reconhecimento aos nossos mestres do saber, que com grande esforço conservam seus grupos folclóricos, parte significativa de nosso patrimônio imaterial. No rodapé da página inseri link's muito importantes cuja leitura recomendo como essencial: a SALVAGUARDA DO FOLCLORE (da Unesco) e a CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO (da Comissão Nacional de Folclore). Este dois documentos são relevantes orientadores da folclorística. O material de textos, fotos e áudio-visuais que compõe este blog pertencem ao meu acervo, salvo indicação contrária. Ao utilizá-lo para pesquisas, favor respeitar as fontes autorais.


ULISSES PASSARELLI




terça-feira, 3 de setembro de 2013

Sá Luíza da Cananéia

No catolicismo popular muitas vezes o povo se apega às crenças de que algumas pessoas, tendo passado uma vida extremamente virtuosa, paciente e penitente, aureolada na obra da caridade e no trabalho em prol da Igreja, alcançaram a santidade, independente do processo oficial do Vaticano.

Assim as pessoas consideram muitos outros “santos” que não fazem parte do hagiológio. Alguns nunca saem desta condição, mas outros são abarcados pela tramitação documental e terminam por alcançar a beatificação, a exemplo da são-joanense de Santo Antônio do Rio das Mortes Pequeno, Nhá Chica, ou a canonização, como o paulista Frei Galvão.

Dentre estas personagens religiosas notáveis, algumas parece que se vão perdendo nas brumas do passado. As novas gerações delas vão se esquecendo, como “Manuelina de Coqueiros”[2], jovem de Entre Rios de Minas que outrora era fervorosamente visitada por romeiros de toda redondeza, inclusive muita gente daqui de São João del-Rei, que ia atrás de suas preces inclusive à pé ou a cavalo. Outra religiosa importante e de que ora me ocupo em especial é “Sá[3] Luíza da Cananéia” (Luiza Leriana, 1873-1958), que desenvolveu seu trabalho religioso no distrito de Emboabas (ex-São Francisco do Onça), em São João del-Rei/MG.

As informações orais que disponho dizem que ela “virou” santa. Foi uma senhora boníssima, justa, muito humilde, fiel da santa comunhão, caridosa, que vivia na graça de Deus.

Morava só, numa casa humilde, no citado distrito, próximo à localidade de Cananéia, distante cerca de 40km de São João del-Rei. Era conhecida por “Sá Luíza da Cananéia”, cujas orações em favor de...  sempre eram ouvidas pelos céus. Por isto era procurada por fiéis.

Como penitência costumava pegar o prato que almoçava parcamente e misturar água na comida, fazendo uma sopa fria para atrapalhar o sabor, pois dizia que era indigna de comer um alimento tão bom.

Certa ocasião, um carreiro estava passando a serviço próximo à sua casa, sob uma forte chuva e viu ao longe um vulto em cima de um cupinzeiro, debaixo daquela chuvarada. Pensou consigo mesmo: “uai, sô... o que será aquilo? Curuiz Credo! É o cariá ou um pantasma?”[4] O carro de bois foi chegando, rangendo no seu canto melancólico o eixo de madeira. O carreiro ressabiado persignou-se: era Sá Luíza da Cananéia que estava em cima de um pequeno ninho de cupins, sentada, esperando o ônibus passar.

_ Ôh, Sá Luíza!
_ Deus te abençoe!
_ Amém! Mas... uai, Sá Luíza, quê que a senhora tá fazêno nessa tribusana?[5]
_ Ô meu fío, mais tá chuvêno?
           
E foi então que o carreiro arrepiou-se... só então notou que ao redor dela naquele cupim estava tudo seco, um fenômeno de sua santidade, garantiu-me meu informante[6].

Minha bisavó pelo lado materno, Luíza dos Santos[7], tinha por Sá Luíza especial admiração e certa amizade, tendo-a visitado algumas vezes, dizendo-a uma mulher de fé inesgotável, agraciada com o dom da cura pela força da oração e uma pessoa muito penitente.

Sá Luíza segundo fonte jornalística[8] teria angariado com muito esforço pessoal donativos para a construção da centenária capela do lugar, dedicada ao Sagrado Coração de Jesus.
               

Aspecto de Cananéia, em 2013. 

Notas e Créditos

* Foto e texto: Ulisses Passarelli



[1] - CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. Rio de Janeiro: Ediouro, [s.d].
[2]  Ver (acesso em 03/09/2013, 21:58h): Mulheres Negras do Brasil 
[3] - Sá: senhora, usual também as formas sinhá, nhá.
[4] - Curuiz: corruptela comum de cruz. Cariá: o demônio. Forma encurtada do africanismo cariapemba. Pantasma: fantasma, na pronúncia popular.
[5] - Tribusana: chuva forte.
[6] - Aluísio dos Santos (1924-2005), natural de São João del-Rei.
[7] - Luíza dos Santos (1893-1985), natural de São João del-Rei, mãe do meu informante.
[8] - Cananéia reforma capela e reclama de abandono: povoado quer preservar memória de Sá Luíza. Gazeta de São João del-Rei, n.65, 16/10/1999, p.3.

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